Da Maricultura ao cultivo de algas

Da Maricultura ao cultivo de algas

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28/01/2025
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NSC

Cultivo é feito em cordas (Foto: Lucas Amorelli, DC)

Da maricultura ao cultivo de algas: como Florianópolis entrou no mercado de biofertilizantes

Cultivo da espécie Kappaphycus alvarezii no Ribeirão da Ilha tem crescido ano a ano, com foco na produção de biofertilizantes para o agronegócio

De crescimento acelerado, nada poluente e muito lucrativa. A produção da alga Kappaphycus alvarezii, que teve o cultivo autorizado em Santa Catarina em 2020, avança a passos largos enquanto gera renda e emprego, além de uma nova alternativa para quem já tem a maricultura como ocupação. No Estado, o cultivo tem como principal produto de valor agregado os biofertilizantes, vendidos para o agronegócio.

As algas são cultivadas em uma espécie de “fazenda” no mar. Os produtores, ou “agicultores”, colocam cabos com 50 metros de comprimento, a uma profundidade de cerca de 40 centímetros, que formam algo semelhante a um “varal” de algas.

As cordas flutuam com uso de boias e são posicionadas e uma distância de 1,5 metro de distância entre si, no mínimo. As mudas são plantadas em um sistema chamado de “tie-tie”, ou “amarra-amarra”, em tradução livre.

São colocadas cerca de 750 mudas em um cabo de 50 metros, que crescem de 5% a 7% ao dia em boas condições, podendo chegar a 10% ao dia, dependendo de fatores como temperatura da água e salinidade.

O ciclo entre plantio e colheita leva cerca de 30 dias, e um cabo com 50 metros pode chegar a 200 quilos de colheita. O processo de colheita, que antes era feito manualmente, agora já conta com a ajuda de um maquinário em estágio de protótipo, que facilita o trabalho dos produtores.

— O manezinho tem esse hábito de inventar as coisas, né? A gente foi inventando, e está dando certo. Enquanto tu colhe manualmente um cabo, aqui tu colhe dez cabos — explica Ademir Dário dos Santos, gerente de cultivo da Algas Brasil, enquanto mostra o maquinário desenvolvido no local.

Processo produtivo

A máquina consiste em uma estrutura de madeira com uma roldana em que é colocada a corda em que as algas estavam plantadas e uma parte estreita, no lado oposto, que segura a corda e faz com que as algas caiam em um saco e sejam levadas diretamente para a primeira etapa do processamento.

A Algas Brasil é uma das pioneiras no cultivo da Kappaphycus alvarezii em Santa Catarina. A empresa conta com oito funcionários diretos, além de terceirizados, e tem capacidade de processar oito toneladas do produto por dia.

O gerente de cultivo da empresa destaca alguns dos desafios que são enfrentados na produção da alga para a indústria de biofertilizantes. O mecanismo que agilizou o processo de colheita fez com que essa fase deixasse de ser um dos entraves, já que hoje é feita de forma mais ágil e com maior produtividade. O processo de plantio, contudo, ainda é mais demorado, por se tratar de um método manual.

Outro desafio é lidar com as condições adversas da natureza, como chuvas intensas, que trazem um excesso de água doce para a superfície, o que impacta a salinidade da água e pode fazer com que as algas morram. Ainda, tempestades, com fortes ventos e o impacto das ondas podem fazer com que as mudas se desprendam das cordas, impactando os produtores.

Foi o caso das chuvas registradas em Santa Catarina na última semana. Para evitar que a produção de algas fosse perdida, produtores como Vinicius Honorato, que cultiva a Kappaphycus alvarezii no Ribeirão da Ilha, em Florianópolis, precisaram “afundar” o cultivo

— Ela fica na superfície e quanto mais profundo, mais salinidade vai ter. Aí a gente joga tudo pro fundo porque lá embaixo fica entre 19, 20 [de salinidade]. Pode ver, que está tudo aqui as algas, mas está tudo no fundo — explica Vinicius ao mostrar as algas submersas.

Ele é um dos 45 produtores que enviam algas para a Algas Brasil transformar em biofertilizante. Além do cultivo no Ribeirão da Ilha, há produtores também no Norte da Ilha, em Palhoça, Bombinhas, Governador Celso Ramos, Biguaçu, São Francisco do Sul e Penha.

Esse é o terceiro ano que Vinicius cultiva algas, e a produção na última temporada, em cinco meses, chegou a 44 toneladas.

— Na verdade, eu cultivo marisco. Minha família, meu tio, tem um rancho e cultiva ostras. Começou com ele, faz 23 anos. Daí eu fiz faculdade de Geografia, não terminei. Comecei a me envolver aqui com o cultivo de marisco — detalha. 

Foram seis anos trabalhando ao lado do tio para impulsionar o cultivo de ostras e mariscos, até a produção da Kappaphycus alvarezii ser introduzida na região. Desde então, o tio segue na maricultura, e Vinicius se dedica exclusivamente à produção de algas.

Vinicius explica que as condições de cultivo no Ribeirão da Ilha, onde sua fazenda de alga fica numa área onde a profundidade do mar é de cerca de três metros, é bastante diferente do cultivo tradicionalmente feito na Tailândia. Por lá, as condições são ideais, com profundidade de água de 1 metro e água quente o ano todo.

— O nosso aqui é de profundidade, e a gente tem muitas condições adversas, muito vento, então ela vai chegar a 700 gramas. Quase um quilo, mas quando chega a 700 gramas, ela acaba caindo — explica.

A alga das Filipinas

Kappaphycus alvarezii é nativa das Filipinas e cultivada em outros países da Ásia, como a Tailândia. No Brasil, ela foi introduzida a partir do Rio de Janeiro, onde o mercado não cresceu de forma tão expressiva como foi em Santa Catarina, a partir de 2020.

A temporada de cultivo se estende de novembro até junho do ano seguinte, podendo variar a partir da influência de questões climáticas. No fim de cada ciclo de produção, que tem cerca de 30 dias, é feito o replantio das algas. Já na colheita, os produtores calculam quanto da produção precisa ser guardado para ser replantado para uma próxima leva.

— Por exemplo, amanhã, como a gente vai colher, eu calculo ali a quantidade que eu tenho que tirar. Por exemplo, é 2 toneladas. Eu sei que cada cabo dá entre 150 e 200 kg. Então eu tenho que tirar no mínimo 11 a 12 cabos para dar essas 2 toneladas. Quando eu tiro isso, eu já tiro esses 10 cabos para venda. E eu já tenho que replantar mais 10, daí eu tiro de outro cabo aleatório e levo pra praia, pro pessoal plantar — detalha Vinicius.

Ainda que qualquer parte da alga funcione como muda, os produtores têm como foco na hora do replantio as partes com maior potencial de desenvolvimento.

— A gente sempre busca as que tão com mais pontinhas, com bastante ramo. Como ela cresce 7% ao dia, e é com o próprio peso dela, por exemplo, cada muda vai dar duas, então cada duas vai dar quatro, cada quatro vai dar oito. Ela vai se multiplicando — afirma.

Há também uma variação de cores, que vai do verde ao amarelo, passando por tons mais vivos e outros mais acinzentados. A coloração depende de fatores como incidência solar, temperatura e salinidade da água.

Algas se transformam em biofertilizantes

Gabriel Ademir dos Santos, diretor de operações da empresa, explica que 90% da alga é líquido. Assim, em 1 kg de alga, 900 ml se tornam extrato e os outros 10% são compostos de carragena e fibra. Esse material também é aproveitado pela fábrica, que produz um aditivo de alga.

— Hoje a gente tem um farelo dela, é um aditivo de alga que a gente já tem conseguido fazer a secagem com o equipamento, que foi desenvolvido também, que está sendo utilizado nas indústrias de fertilizantes. Agora está começando alguns testes com ração animal, como aditivo de ração para o suíno, para aves — afirma Gabriel. 

O processo de produção do biofertilizante envolve a alga chegar até a unidade no Ribeirão da Ilha, seja pelo cultivo e colheita da própria empresa ou por recebimento de outros produtores, e passar por uma primeira etapa, de limpeza na água doce. Depois, é feito o processamento, nas fases de trituração e prensagem.

— O nosso extrato de alga é totalmente orgânico, ele não passa por nenhum processo químico de extração do produto. Depois dessa fase de processamento, a gente faz o envase do produto e é encaminhado para o Centro de Distribuição (CD) — detalha.

Atualmente, a empresa possui como produto principal o fertilizante orgânico simples classe A, com 3% de carbono orgânico, que é o extrato de alga líquido. Esse fertilizante é utilizado de forma foliar, através da pulverização nas culturas. 

Ainda, a empresa está em processo de registro do fertilizante que utiliza a fração sólida da alga, como um fertilizante orgânico, porém com concentração de carbono orgânico maior.

 

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